segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Voz dos Bronzes / Linguagem dos Sinos

TORRES E SINOS DA IGREJAS DE MARIANA - MG - (todas as fotos de Bizute)

Torre e sino da Câmara Municipal de Mariana 

Campanário (sineira) da Capela Santana - Mariana

Torre e Sino da Igreja Arquiconfraria de Nossa Senhora Rainha dos Anjos - São Francisco dos Cordões - Mariana

Torres e Sinos da Catedral Basílica de Nossa Senhora da Assunção -  Sé - Primeira Catedral construída em Minas Gerais



Torre e Sinos da Igreja de Nossa Senhora das Mercês - Mariana

Torres e Sinos da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (Igreja dos negros)  - Mariana

Torres e Sinos da igreja de São Francisco de Assis - Mariana 

Torres e Sinos da igreja de São Pedro (única igreja que o turista tem acesso a torre e ver o sino de perto e uma bela vista da cidade) - Mariana

Torres e Sinos da igreja so Santuário de Nossa Senhora do Carmo

Torres e Sinos das igrejas de São Francisco e Carmo - Mariana

Sino da Catedral da Sé - Mariana

A Voz dos Bronzes / Linguagem dos Sinos

Autor “Moura Santos”
A majestosa música sacra hoje, infeslimente, está banida dos templos, substituída por novos rituais, se ouvindo mais o sublime canto-chão, que empolgava o ambiente de comoção e religiosidade até então conhecido.
Cedeu-lhe o lugar para introdução de cânticos corriqueiros, inexpressivos e estrofiados, tanto na letra como nas melodias.
São arranjos medíocres, sem nenhuma expressão de arte e de espiritualidade.
Só os SINOS das velhas cidades mineiras resistiram à modernidade da igreja.
Devemos conhecer a linguagem de nossos bronzes vetustos, que do alto das torres cantam, há séculos, a epopéia de um passado dentro das maravilhas da fé e do culto divino.
Chamam os fiéis à prece. Choram os mortos, anunciam festividades no ano inteiro. Marcam passagens e triunfos sociais, religiosos e históricos.
Acompanhando o ritmo da música e dos cânticos litúrgicos, os sinos são instrumentos sonoros que exprimem alegria, tristeza, paixão, amor e uma série de sentimentos, condizendo com a altura onde são colocados para perpetuidade de uma fé, que se alteia acima de tudo.
Por isso, têm eles a sua poesia e a sua história.
As ondas sonoras que projetam representam a prece, com a diferença apenas que a prece dos sinos faz-se de dentro para fora, enquanto que a do homem se dirige mistificamente de dentro para o alto: -“Sursum corde”.
ARAUTOS DE DEUS
A linguagem sentimental dos bronzes fala ao coração de todas, desde o berço à sepultura, segue-lhes os passos desde o batismo até a última morada.
Todos os lances da vida humana cristianizada estão na evocação de uma badalada de sino e foi por esse princípio e por razão natural que os arrojados construtores do barroco emprestavam o maior cuidado e especial atenção no delinear esses monumentos de artte, colocando em remate torres altaneiras e atrevidas para sustentar pesados bronzes – arutos sinfônicos da palavra de Deus.
Mariana, capital de um mundo antigo em Minas Gerais, teve os seus construtores e entalhadores, artistas consumados, que delinearam suas bicentenárias igrejas. Sé Catedral, São Francisco  de Assis, Santuário do Carmo, Nossa Senhora do Rosário, Arqui-Confraria, Mercês, além de outras Capelas, ressaltam, à primeira vista, na competição artística de seus idealizadores.
Irmandade com patrimônio respeitável, constituídas de leigos, regendo-os uma vontade hercúlea de construir maravilhas, o primeiro lance que as preocupava era a estrutura da Torre para sustentar os bronzes de toneladas impressionantes.
E nelas colocavam sinos fundidos em bronze com mistura de ouro em alto teor e grande quantidade de prata, segundo consta de documentos ora consultados, para efeito da sonoridade em escala musical.
Os Campanários entravam logo no regime de toques especiais: - festivo, fúnebre, repique e dobrado, santos em glória e “entradas” convencionais para missas, procissões, enterros, viáticos e depósitos à noite.
OS ARTISTAS DO BADALO
Os sineiros eram abalizados na arte do badalo e o acionavam com maestria e gosto bem apurado. Pedro Tortela, na Sé-Catedral, conseguiu tocar a “Sinhá do Balão lá vai pau”, samba carnavalesco do folclore marianense, que o chantre não gostou, azucrinando-o pelo irreverente abuso. Na igreja de São Francisco de Assis, outro sineiro famoso imaginou um toque original que quer dizer: - “Dá no pai, dá na mãe, dá no filho também” ou, então na repetição métrica idealizada por João Gato: - “Zé Venero, Zé Venero – Sô Cônego Tobias”. E nos dobres fúnebres, os zig-zags de um inveterado e educado boêmio pelas ruas da cidade, o conhecido filósofo e poeta repentista, o afável “Nico do Beco”, sempre acompanhado dos parceiros João Julio, Zé dos Óculos, Zé Pinto, Mestre Luiz, Zé Sacy, Tondy, todos com ares de artistas, literatos, oradores, músicos, dada um com a sua mania de importantes, que os tornavam ídolos da população e, particularmente, das crianças.
O Comissário da Ordem Terceira, aplainando as polêmicas, censuras e críticas, aprovou a genial criação que se tornou inspiração para dobrados de bandas de Músicas, quando a “União XV de Novembro”, com sucesso, tocou “os sinos de Mariana”, do consagrado maestro Aníbal Pedro Walter.
O exemplo fez escola e teve continuadores autênticos nas figuras de Zé Xiringa, Fancy Caiau, Diogo da Conceição, Chico Cidade, Mané nas figuras de Zé Supimpa, Mané Donzela, Cici Bandeira, exímios tocadores de sinos de Mariana.
Era uma profissão humilde, sem remuneração, mas honrosa para os artistas do badalo.
O mais célebre – Chico - Cidade, morreu tragicamente nos dias de carnaval, por ocasião das “quarentas horas”, quando dobrava o sínodo Santíssimo, da Catedral. Ao impulsionar o pesado bronze para os três “bambaus” convencionais, o sineiro, que estava completamente bêbado, deixou-se prender às cordas que o envolveram e o sino, depois de muitas reviravoltas, o atirou estraçalhado nas lages da rua.
E toda população lamentou profundamente: - morreu o Chico - Cidade! ...
RITUAL
Nas igrejas de Irmandades e Ordens Terceiras, os sinos obedecem ao ritual de cada comunidade. Tem o seu toque convencional.
Quando morre um Irmão, os dobres fúnebres são de três “sinais”; quando mulher, dois “sinais”. Para crianças até sete anos repicam-se os quatro sinos. Para os que morrem fora da cidade, os “sinais” são dados às 14 horas.
Para funerais de bispos, nove badaladas e cinco “sinais” de três em três horas. Para padres até monsenhor, cinco “sinais” ao dia.
Para anunciar a morte de Papa: 12 badaladas, seguidas de nove “sinais”, de duas em duas horas, até o sétimo dia.
Assim, quem reside em Mariana, ou nas cidades históricas, que ainda conservam tradição de 200 anos, conhece e distingue a voz dos bronzes e pode decifrar logo pelo toque dos sinos: se morreu um homem, uma mulher, um anjinho, uma criança, um bispo, um Papa, ou melhor, se há missa, procissão, enterro de festas religiosas ou profanas. Os sermões principais do ano eram anunciados de vésperas com o dobre do sinto grande da Catedral.
Para os toques solenes da Semana Santa, o sineiro obedecia ao seguinte programa do mestre de cerimônias:
Quarta- feira Santa: às 12 horas, um repique com os quatro sinos. ”Santos em Glória” nove vezes e logo a seguir três repiques com quatro sinos. Às 18 horas e trinta minutos, um repique com quatro sinos e do Relógio, marcando o baixo; dobra o Sino das Almas, conservando-o invertido.
Às 19 horas, desce o Sino de Almas, um repique, em seguida apruma o bronze com repique dobrado e muitos “bambaus”, até colocá-lo de pé.
Quinta - feira Santa: às 9 horas, dois repiques – levanta o Bronze e o abaixa com repiques-dobrados; depois mais dois toques ritmados e “entrada” para o Pontifical Solene. Às 09h30min, outra “entrada”. Às 10 horas, chegada do bispo pontificante ao som do “Esse sacerdos Magnus”.
No “Glória”, repique vibrante e compassado, repetindo-se na “elevação”.
Às 12 horas, novos repiques. Às 17 horas, um repique para aprumar o bronze e o abaixa em vibrantes repiques.
Depois do repique no “Glória”, silenciam os sinos até zero horas de Domingo da Ressureição, substituindo-os a velha Matraca, que acompanha a procissão da Paixão ao lado da Verônica.
A Voz dos bronzes tem a sua cadeira canônica, a cada instante, nas cerimônias celebrada: - Ta na hora, velho Irmão, apruma o Bronze.



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